No coração do distrito limeiro de Pueblo Libre se ergue uma instituição que guarda mais de 200 anos de história e conserva o legado cultural mais importante do Peru. O Museu Nacional de Arqueologia, Antropologia e História do Peru (MNAAHP) não é apenas um museu; é o guardião da memória nacional e o primeiro museu do país, fundado em 1822 sob o patrocínio do libertador José de San Martín.

História e fundação: Mais de dois séculos de tradição cultural
Os primeiros anos (1822-1900)
O Museu Nacional do Peru foi fundado sob o patrocínio de José de San Martín em 1822 por José Bernardo de Tagle, Bernardo de Monteagudo e Mariano Eduardo de Rivero e Ustariz, que assumiu a direção do projeto em 1826. Durante suas primeiras décadas, sem um local fixo, a coleção foi se estabelecendo em diversos lugares, até que em 1872 o patrimônio foi exposto no Palácio principal da Exposição Internacional de Lima.
A primeira coleção do museu foi formada a partir de escavações arqueológicas pioneiras, doações generosas e a aquisição estratégica de objetos pré-hispânicos que já começavam a despertar o interesse científico internacional.
A era de Max Uhle e Julio C. Tello (1900-1945)
No dia 6 de maio de 1905, foi recriado com o nome de Museu de História Nacional, sendo nomeado diretor José Augusto de Izcue, que contratou o prestigiado arqueólogo alemão Max Uhle. Essa colaboração marcou um marco na arqueologia peruana, pois Uhle introduziu métodos científicos modernos no estudo das culturas pré-hispânicas.
Em 1911, Julio C. Tello assumiu a área arqueológica, sendo diretor Emilio Gutiérrez de Quintanilla. Nessa época, o museu contava com uma coleção de mais de 9000 peças arqueológicas inventariadas. Tello, considerado o pai da arqueologia peruana, transformou fundamentalmente a compreensão das culturas pré-colombianas do país.
Evolução institucional e consolidação moderna
A história do museu reflete as mudanças políticas e acadêmicas do Peru. Devido a discrepâncias entre o diretor e Tello, a seção de Arqueologia se independizou em 1924 como Museu de Arqueologia Peruana, enquanto a parte colonial e republicana adotou o nome de Museu Bolivariano.
Finalmente, em 1992, as duas se fundiram novamente, nascendo o Museu Nacional de Arqueologia, Antropologia e História do Peru. Entre seus diretores, encontraram-se personalidades intelectuais reconhecidas do Peru, como Fernando Silva Santiesteban, Duccio Bonavia, Luis Guillermo Lumbreras, María Rostworowski e Franklin Pease.
Coleções: Um tesouro nacional de 300.000 peças
Patrimônio pré-hispânico
O MNAAHP conta com uma enorme variedade de objetos culturais históricos da civilização peruana, abrigando mais de 300.000 peças que abrangem toda a ocupação humana do que hoje é o Peru. Esta impressionante coleção inclui:
Cerâmica: A coleção mais numerosa de cerâmicas do Antigo Peru, que vai desde as primeiras manifestações de cerâmica até as refinadas produções incaicas. Cada peça conta uma história sobre a vida cotidiana, as crenças religiosas e o desenvolvimento tecnológico das civilizações peruanas.
Têxteis: Uma extraordinária coleção de tecidos que vai desde os primeiros habitantes até a época inca, mostrando técnicas de complexidade avançada e riqueza artística que ainda surpreendem os especialistas modernos. Os mantos de Paracas são particularmente destacados por sua preservação excepcional e seus intrincados designs.
Metais preciosos: Uma importante coleção que inclui objetos de ouro, prata e pedras preciosas que testemunham a maestria dos ourives pré-hispânicos. Apesar do roubo de 1981 que afetou 220 peças, a coleção mantém exemplares excepcionais.
Material lítico: Esculturas, ferramentas e monumentos de pedra que incluem algumas das peças mais emblemáticas da arqueologia peruana.
Joias da coleção: Peças emblemáticas
A Estela Raimondi: Obra-prima da arte Chavín
Dentro da cultura Chavín, uma das peças icônicas é a estela Raimondi (400 a.C.-200 a.C.), uma laje de granito sobre a qual está esculpida a imagem de uma das principais divindades do templo de Chavín de Huántar.
Trata-se de uma laje de granito de 1,98 m de altura por 74 cm de largura e 17 cm de espessura, que tem esculpida em uma de suas faces a representação da divindade principal dos chavinos na época do Templo Novo. A estela representa o “Deus dos Bastões”, uma divindade que combina características humanas, felinas e de aves de rapina, simbolizando o poder sobre os elementos naturais.
O Obelisco Tello: Simbolismo dualista

O Obelisco Tello é uma escultura de 2,58 metros de altura que representa duas entidades semelhantes a dragões, provavelmente masculino e feminino. Esta peça complementa perfeitamente a Estela Raimondi na representação da cosmovisão chavín, mostrando a dualidade que caracterizava o pensamento andino pré-hispânico.
As Mãos Cruzadas de Kotosh
Uma das esculturas mais antigas e misteriosas do continente, que representa mãos humanas cruzadas esculpidas em barro, datando de aproximadamente 4.000 anos de antiguidade. Esta peça testemunha o desenvolvimento artístico e religioso das primeiras sociedades complexas do Peru.
Mantos de Paracas
Os têxteis de Paracas representam uma das tradições têxteis mais sofisticadas do mundo antigo. Estes mantos funerários, com seus complexos designs policromáticos e técnicas de bordado extraordinárias, sobreviveram mais de 2.000 anos em perfeito estado de conservação graças ao clima desértico da costa peruana.
Coleções colonial e republicana
O museu também abriga importantes fundos documentais, fotográficos e bibliográficos que dão conta dos períodos colonial e republicano. A coleção inclui:
- Pinturas da Escola Cuzqueña de pintura do período virreinal
- Obras do período republicano
- Objetos de valor histórico-artístico que narram a transição do Peru para a independência
- A Quinta dos Libertadores, onde habitaram José de San Martín e Simón Bolívar
Arquitetura e instalações: O palácio da Magdalena
História do edifício
O museu se encontra no antigo Palácio da Magdalena, ao redor da Praça Bolívar. A Quinta dos Libertadores, mandada construir pelo Virei Pezuela, nos mostra os espaços onde habitaram também Don José de San Martín e Don Simón Bolívar.
O edifício combina elementos arquitetônicos do período colonial tardio e republicano, criando um ambiente histórico que complementa perfeitamente as coleções que abriga. Os visitantes podem caminhar pelos mesmos espaços onde os libertadores da América planejaram o futuro do continente.
Distribuição atual
A exposição permanente do museu ocupa uma superfície de 23.000 m² distribuídos em 30 salas. Esta vasta área permite uma apresentação cronológica que guia os visitantes desde os primeiros habitantes do território peruano até a época republicana.
Renovação e modernização: Rumo ao futuro
Projeto de remodelação integral
O Museu Nacional de Arqueologia, Antropologia e História do Peru (MNAAHP), o primeiro museu do país e um dos espaços culturais mais importantes da capital peruana, fechará suas portas ao público no próximo dia 28 de fevereiro. Mais de 250 mil peças serão transferidas para dar lugar a uma reforma integral que modernizará os espaços e narrativas do MNAAHP, tornando o lugar um referencial cultural do século XXI.
O projeto contempla a recuperação e conservação da infraestrutura, melhorias nas áreas de depósitos, uma renovada museografia, assim como a otimização dos programas educativos e a implementação de oficinas.
Objetivos da modernização
O ambicioso projeto de renovação busca:
- Cumprir com padrões internacionais de conservação e exibição
- Incorporar tecnologias modernas para uma experiência interativa
- Redesenhar a narrativa museográfica para audiências contemporâneas
- Melhorar a acessibilidade para pessoas com deficiências
- Otimizar os sistemas de climatização e segurança
- Criar novos espaços educativos e de pesquisa
Informações práticas para visitantes
Localização e acesso
Endereço: Praça Bolívar s/n, Pueblo Libre, Lima Distrito: Pueblo Libre (altura da quadra 8 do Jirón General Vivanco, em frente ao Município)
Horários e preços
Horários regulares de terça a domingo, das 9:00 às 19:30; segunda-feira, das 12:00 às 19:30.
Entrada: Atualmente gratuita para todos os visitantes
Nota importante: O museu fechará no dia 28 de fevereiro para iniciar o processo de remodelação. Durante este período, apenas a Sala Independência na Quinta dos Libertadores estará disponível.
Serviços disponíveis
- Biblioteca
- Livro de Reclamações
- Livraria
- Banheiros
- Acessibilidade: Cadeira de Rodas
Serviços educativos:
- Visitas guiadas especializadas
- Oficinas para crianças e adolescentes
- Programas educativos para escolas
- Conferências e palestras acadêmicas
Contato
Telefone: (01) 618939-5248 E-mail: mnaahp@cultura.gob.pe Redes sociais: Facebook e Instagram (@museonacional_pueblolibre)
Programas culturais e educativos
Atividades regulares
Quintas Culturais: É um espaço voltado a oferecer aos grupos artísticos a possibilidade de mostrar sua arte à comunidade. Grupos de teatro, música e dança apresentam todas as quintas variados espetáculos, matizados com palestras, lançamentos de livros e conferências sobre temas de interesse geral.
Fins de Semana Infantil: O Museu apresenta todos os fins de semana peças para crianças. Aos sábados, podem ser apreciadas apresentações ao ar livre nos jardins e todos os domingos, nos horários das 15:00 e 17:00, os menores têm um encontro no auditório.
Pesquisa e publicações
O museu mantém uma tradição acadêmica sólida através de suas revistas especializadas:
- Revista Arqueológicas: Publicação científica que divulga pesquisas arqueológicas
- Revista História e Cultura: Focada em estudos históricos e culturais
- Publicações especiais: Catálogos, estudos monográficos e material educativo
Oficinas de conservação
O museu conta com oficinas de conservação de objetos arqueológicos, destacando as de têxteis e metais. Essas oficinas não apenas preservam o patrimônio, mas também formam novas gerações de conservadores.
Importância Cultural e Legado
Um Espaço de Encontro com a História
Todos eles fazem deste espaço um lugar de encontro com a história do Peru. O MNAAHP transcende sua função como repositório de objetos para se tornar um espaço vivo onde o passado dialoga com o presente.
Contribuição à Identidade Nacional
Este museu é o mais antigo e representativo do nosso país por seu valioso, variado e vasto patrimônio cultural que provém das primeiras expedições científicas realizadas no Peru, assim como das primeiras coleções formadas pelo estado peruano.
O museu desempenhou um papel fundamental na construção da identidade nacional peruana, ajudando os cidadãos a compreender e valorizar a riqueza de sua herança cultural.
Impacto Internacional
Como guardião de uma das coleções arqueológicas mais importantes da América, o MNAAHP atrai pesquisadores, estudantes e visitantes de todo o mundo. Suas coleções têm sido objeto de estudos que revolucionaram a compreensão das civilizações pré-colombianas americanas.
Desafios e Oportunidades Futuras
Conservação no Século XXI
O projeto de modernização responde aos desafios contemporâneos da conservação museológica:
- Mudança climática e seus efeitos na preservação
- Novas tecnologias de documentação e exibição
- Padrões internacionais de acessibilidade
- Sustentabilidade ambiental nas operações do museu
Democratização do Acesso
A renovação busca tornar o museu mais acessível a diversos públicos:
- Melhoria da experiência para visitantes com deficiências
- Conteúdos multilíngues para turistas internacionais
- Programas educativos adaptados a diferentes idades
- Uso de tecnologia para alcançar audiências remotas
Projeção Internacional
O novo MNAAHP aspira a se tornar um referencial mundial em museologia arqueológica, mantendo sua liderança na pesquisa e conservação do patrimônio cultural peruano enquanto se posiciona como um destino cultural imprescindível na América Latina.